Twitter Facebook

31 de março de 2016 - Ano 08- Nš 371

 

Opinião
 
Comissão do CRCSP sobre Contabilidade Pública
Grupo trabalha com foco na consolidação das contas públicas e apoia profissionais contábeis para o sucesso na mudança


Nesta edição do CRCSP Online, o conselheiro do CRCSP, coordenador da Comissão de Contabilidade Pública e auditor do Tribunal de Contas do Município de São Paulo, Valmir Leôncio da Silva, explica que, neste ano, o Brasil realizará a consolidação das contas públicas em todos os municípios e que, com isso, os gestores públicos poderão ter acesso a informações mais precisas sobre arrecadação, aplicação dos valores e estado dos patrimônios. Ele diz ainda que a sociedade poderá acompanhar os gastos da administração.

Devido a todas essas mudanças, o Conselho criou uma comissão que visa apoiar profissionais contábeis e servidores que atuam no setor público para o sucesso no processo de adoção das novas diretrizes.

Está previsto que o Brasil realizará a consolidação das contas públicas neste ano. Essa é uma mudança que já vem sendo discutida há muito tempo?
Sim. Essa consolidação acontecerá entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. A uniformidade de procedimentos dos diferentes entes da Federação deve seguir as orientações do Plano de Contas Aplicado ao Setor Público (PCASP) e também do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MCASP), publicado pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN), atualmente em sua 6ª edição. E todos os profissionais contábeis que atuam nesse segmento precisam estar cientes e capacitados para executar a mudança.

O que provocou essa mudança?
A Contabilidade brasileira sofreu uma reviravolta desde a convergência às Normas Internacionais de Contabilidade por meio da Lei n.º 11.638, promulgada no final de 2007. Editadas pela Federação Internacional de Contadores (International Federation of Accountants – Ifac), as Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (International Public Sector Accounting Standards – Ipsas) tiveram que ser adaptadas à realidade brasileira. Especificamente para o setor público, em 2008, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) publicou as Resoluções CFC n.º 1.128 a 1.137, editando as Normas Brasileiras de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público (NBCASP). Em 2011, foi a vez de ser publicada a Resolução CFC n.º 1.366, também direcionada à Contabilidade Pública, disciplinando a implantação do Sistema de Informação de Custos no Setor Público.

Como ficará a Contabilidade Pública?
Além do Balanço Patrimonial, do Balanço Financeiro, da Demonstração das Variações Patrimoniais e do Balanço Orçamentário, as novas normas para o setor público exigem dois novos demonstrativos: Demonstração do Fluxo de Caixa e Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido, obrigatória para as empresas estatais dependentes, conforme estabelecido na Norma 16.6, que trata dos demonstrativos contábeis.  Também deverão ser elaboradas as Notas Explicativas, que são partes integrantes das demonstrações contábeis.

Com base em todas essas alterações, quais os objetivos da Comissão do CRCSP?
O Conselho, por meio da Comissão, realiza palestras e seminários disseminando os conhecimentos necessários, tanto para a população quanto para os técnicos que elaborarão os demonstrativos, trabalhando para que a adoção ocorra com sucesso.

Quais os benefícios dessa mudança para os próprios gestores dos municípios?
Por meio da nova Contabilidade, eles poderão ter acesso a informações mais precisas e completas sobre o andamento da administração, especificamente a arrecadação, aplicação dos valores e o estado do patrimônio da administração.

Quais os benefícios para a sociedade?
A nova Contabilidade busca trazer mais clareza e transparência sobre os atos da administração pública, permitindo um acompanhamento do que foi arrecadado, qual o valor e como foram aplicados esses recursos. Isso permitirá que a população possa questionar a administração sobre a qualidade dos gastos públicos, fato que hoje praticamente não é feito.

Essas demonstrações já foram entregues em 2015 para consolidação da União em 2016?
Sim, pois, conforme a Portaria n.º 733/2014, da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), eram de observância obrigatória a partir do exercício de 2015. A partir do exercício de 2016 todos os entes deverão encaminhar seus demonstrativos para consolidação. Essa consolidação acontecerá entre a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Tudo está disposto no art. 51, da LC n.º 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), que dispõe que os municípios encaminharão suas contas ao Poder Executivo da União, com cópia para o Poder Executivo do respectivo estado, até 31 de abril, e os estados encaminharão suas contas até 31 de maio do ano seguinte à elaboração do balanço.

Todos os municípios e estados fizeram seus demonstrativos referentes ao exercício de 2015 com base no padrão estabelecido pela STN ?
Infelizmente, não. Uma pesquisa publicada em 19 de novembro de 2015, feita pela Confederação Nacional de Municípios (CNM) mostrou que os municípios brasileiros estão encontrando dificuldades para entender a aplicação dos conceitos orçamentários na nova Contabilidade. O levantamento foi feito entre 19 de outubro a 4 de novembro, com objetivo de conhecer as dificuldades dos profissionais da contabilidade municipais ao utilizar as informações orçamentárias no contexto da nova Contabilidade Pública. Ao todo, 646 municípios participaram da amostra. De acordo com as respostas, menos de 10% conseguiram identificar os três critérios que devem coexistir para se registrar uma receita pública: estar previsto na Lei Orçamentária Anual; não ser passível de devolução; estar disponível para realizar despesas públicas. Quanto aos critérios que devem ser observados para o reconhecimento das despesas orçamentárias, quase 60% assinalaram corretamente a alternativa "empenho". Contudo, mais de 30% dos profissionais entenderam que registro deveria ser feito no momento do recebimento do bem ou serviço, o que seria um conceito patrimonial.

O que acontecerá com os municípios que não apresentaram os demonstrativos contábeis?
Estão previstas sanções para quem não apresentou os demonstrativos contábeis até 31 de dezembro de 2015. Um município que não implante, mas envie seus dados para consolidação com base nas novas normas até 30 de abril de 2016 não receberá quitação quanto à obrigação prevista no § 1º do art. 51 da Lei Complementar n.º 101, de 2000.  O descumprimento dos prazos previstos impedirá, até que a situação seja regularizada, que o ente da Federação receba transferências voluntárias (convênios firmados pela União e estados com o município) e contrate operações de crédito (empréstimos de longo prazo). As regras valem da mesma forma para este ano, ou seja, as demonstrações de dezembro de 2015 deverão ser entregues nos prazos do artigo 50 da LRF.

Em tempos de fraudes e corrupção, estamos falando de uma mudança que pode ajudar no controle e fiscalização das ações públicas?
Sim. A Constituição Federal elegeu o Legislativo, que por meio dos Tribunais de Contas realizam a fiscalização financeira, orçamentária, operacional e patrimonial dos entes públicos e das entidades da administração direta e indiretas. Mas a população pode e deve ajudar nessa fiscalização, pois, afinal, o maior acionista da administração é o cidadão que paga os impostos e que agora poderá exercer de maneira mais simples o seu poder de fiscalização.

Como a sociedade tem acesso a esses demonstrativos? Eles são claros?
Todos esses demonstrativos contábeis são técnicos, mas eles deverão ser "simplificados" pelos próprios técnicos para que a população diretamente ou por meio dos diversos tipos de mídia entenda o que está ocorrendo na administração. O que não falta são leis que obrigam os órgãos a disponibilizar essas informações. Por exemplo, a Lei Complementar n.º 131/2009, que se refere à transparência da gestão fiscal, determina a disponibilização em tempo real das informações sobre a execução orçamentária e financeira da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. A Lei n.º 12.527/2011garante o acesso às informações dos órgãos públicos e a Lei Complementar n.º 101/2000 determina que as contas apresentadas pelo chefe do Poder Executivo (prefeito, governador e presidente) fiquem disponíveis durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração para consulta e apreciação dos cidadãos e de instituições da sociedade. Temos várias legislações dispondo a respeito da divulgação das informações, o que falta é verificarmos se elas estão sendo cumpridas adequadamente.

Fale um pouco sobre a história da Contabilidade Pública
Historicamente, as primeiras diretrizes para a Contabilidade Pública foram dadas pela Lei n.º 4.320, promulgada em 1964. Regras foram estabelecidas para que o Brasil tivesse normatizado um orçamento público, com controle das finanças públicas. A partir daí, a Contabilidade Pública passou a ter um destaque maior no país, com enfoque nos conceitos orçamentários e menor destaque para os aspectos patrimoniais.

A consolidação das contas públicas está ocorrendo desde o ano passado ou é a partir deste ano?
A Portaria STN n.º 634, de 2013, determinava que a consolidação deveria ocorrer já a partir do exercício de 2015,  mas  não foi o que aconteceu, pois faltaram demonstrativos. A Demonstração dos Fluxos de Caixa (DFC) e a Demonstração das Mutações do Patrimônio Líquido (DMPL), conforme regras dispostas na Parte V do Manual de Contabilidade Aplicada ao Setor Público (MCASP), 5ª edição, eram de observância facultativa no exercício de 2014. Com a Portaria STN n.º 733, de 26 de dezembro de 2014, ficou determinado que todas as Demonstrações Contábeis Aplicadas ao Setor Público (DCASP), seriam de observância obrigatória a partir do exercício de 2015. É o que consta nas regras da 6ª edição do Manual. Isso quer dizer que a consolidação total deve acontecer a partir deste ano de 2016.

A partir de agora as estatais vão ter que apresentar nos demonstrativos os fluxos de caixa e mutações de patrimônios?
As estatais terão que apresentar esses demonstrativos, apenas no caso de serem consideradas empresas estatais dependentes, conforme determina o art. 2º da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

O que isso impacta no cenário da Contabilidade Pública? O que são mutações de patrimônio?
 Uma empresa é considerada dependente quando não consegue se sustentar sozinha e precisa de recursos financeiros do órgão estatal que a criou. Ou seja, ela é uma empresa deficitária. Se fosse uma empresa privada com certeza entraria em processo de falência, mas como é pública, ela fica atrelada ao ente controlador até que possa se firmar novamente. Mutações patrimoniais são todas as alterações que acontecem no patrimônio de uma entidade como, por exemplo, alteração de valores a receber, a pagar, alteração dos bens que a entidade tem.

Neste que é um ano decisivo, quais são as principais metas da Comissão de Contabilidade Pública?
Considerando que temos 645 munícipios no estado de São Paulo, nossa tarefa será árdua. Nossa pretensão é continuar levando, por meio do Conselho Regional de Contabilidade, palestras e seminários sobre administração pública e, principalmente, a nova Contabilidade. Temos percebido na capital e no interior que o público vem aumentando a cada ano e que muitos profissionais da contabilidade que assistem nossas palestras são do setor privado e de diversas áreas. Isso demonstra um grande interesse de outras áreas pela administração pública.