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23 de agosto de 2018 - Ano 09 - Nº 492
Opinião
 

Excesso de exigências burocráticas contribuem para fechamento de empresas no Brasil
Artigo da presidente do CRCSP, Marcia Ruiz Alcazar, mostra malefícios dos excessos das obrigações acessórias


Marcia Ruiz Alcazar*

Mais de 60% das empresas brasileiras fecham antes de completarem cinco anos, segundo pesquisa do IBGE, divulgada em 2017. Os dados mostram que, dentre as causas do fechamento, a burocracia na operação da empresa impede o bom andamento dos negócios.  Os empreendedores e gestores no Brasil dedicam uma enorme quantidade de tempo - em torno de 2.000 horas por ano, segundo o Banco Mundial, apenas para lidar com questões burocráticas e com o pagamento de impostos.

No lugar de focar na gestão e operação do seu negócio, empreendedores sofrem com a complexidade tributária. No Brasil, são criadas 30 novas regras tributárias todos os dias, ou mais de uma norma a cada hora. Existem em vigor 63 tributos e 97 obrigações acessórias, que devem ser enviados ao Fisco com prazos pré-estabelecidos, sob pena de multa.

É esse emaranhado em que se embolam as empresas e onde os profissionais da contabilidade, que lidam com essa burocracia tributária, são obrigados a seguir 3.790 normas, o que equivale a 5,9 quilômetros de folhas impressas, segundo pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT).

Exportados para sistemas desenvolvidos pelo Fisco, com transmissão via internet, nem por isso a burocracia diminuiu. A via eletrônica continua complexa e burocrática, serve para aumentar o custo da fiscalização, gerando um valor maior para as empresas, que devem ter mais sistemas e mais controle para prestar ao Fisco.

O profissional da contabilidade brasileiro precisa ter um conhecimento enciclopédico: deve conhecer a legislação federal, as 27 legislações tributárias estaduais e as 5.570 municipais!

As novas normas surgidas todos os dias, com várias exceções à regra, cada uma com um cálculo diferente, de cada regulamentação específica, que muitas vezes devem ser enviadas em duplicidade - pois nem todos os sistemas dos estados estão integrados -, obriga os profissionais e empresários da contabilidade a trabalharem muito mais para o governo do que para seus clientes.

Segundo o Banco Mundial, o Brasil é o campeão de desperdício de tempo no cálculo e pagamento de impostos. As 1.958 horas gastas por ano nessa tarefa colocam o Brasil como lanterninha no cumprimento das obrigações tributárias. A Bolívia ocupa o penúltimo lugar com 1.025 horas por ano; a Argentina gasta, em média, 311,5 horas/ano; o México, 240,5 horas/ano e os países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), 160,7 horas anuais.

Obrigação acessória não deve ser obrigatória. Já basta cumprirmos a obrigação principal de pagar impostos abusivos neste país.

Não criamos resistência alguma para que a plataforma do Sistema Público de Escrituração Digital (Sped) desse certo, participamos de comitês técnicos com postura sempre colaborativa em busca de uma ambiente de negócios muito mais favorável, acreditando que as antigas obrigações acessórias seriam extintas. Mas hoje temos mais estas obrigações acessórias: Sped NF-e, Sped ECD, Sped ECF, Sped Contribuições, Sped Fiscal, Sped eSocial.

Na prática fomos enganados, acumulamos função de controle fiscal com essa imposição. Estamos atolados e sobrecarregados com tanta redundância de informação. Até quando?

Agora queremos o FIM! FIM das multas das obrigações acessórias e, principalmente, o FIM das antigas obrigações acessórias. Em tempos de Sped não podemos aceitar esse acúmulo de função de controle fiscal. O que o governo precisa já tem, e com requintes de detalhes. Que ele se organize, estruture esses dados e pare de transferir para sociedade essa responsabilidade e esse custo desnecessário.

Sai governo, entra governo, o Brasil discute a necessidade de fazer uma reforma tributária e simplificar o pagamento de impostos. Atualmente, há uma proposta em análise no Congresso. O foco é a unificação de alguns impostos e fim de isenções fiscais. Mas não há previsão, no entanto, de redução da burocracia.

Antes de uma reforma tributária para redução de impostos, precisamos mesmo é que sejam revogadas todas as obrigações acessórias. É injusto exigir de todos, quando apenas poucos contribuintes são fiscalizados.

Será que existe algum candidato com essa coragem e vontade política?  A sociedade clama por isso há décadas e é ignorada. A classe contábil, que é composta por 500 mil profissionais no Brasil, atende mais de 20 milhões de empresas, que ao todo empregam mais de 100 milhões de trabalhadores.  Merece seu devido respeito, pois sabe com propriedade o que pede.

Vamos exigir isso de quem ousa pedir nosso voto! 

Mais simples do que a reforma tributária é a revogação de todas as obrigações acessórias. Se é acessória, não deve ser obrigatória. 

Esse não é o Brasil que queremos!

*Presidente do Conselho Regional de Contabilidade do Estado de São Paulo (CRCSP)